1.
Introdução
Campo Formoso,
antiga Freguesia Velha de Santo Antonio da Jacobina, situada no Sertão das
Jacobinas, foi um dos primeiros núcleos coloniais do sertão norte da Bahia no
séc. XII. Época em que o projeto colonial empreendido por Portugal passou por
um processo de interiorização. Tem o seu nome originado a partir da designação
que os indígenas davam à região, "nupuranga", que significa
"Terra Bela”.
Serviu como cenário para os movimentos de ocupação e povoamento de
exploradores, curraleiros, missionários e autoridades. Tais movimentos
proporcionaram o despovoamento e interação de diversas etnias indígenas, os
temidos “Tapuias” do Sertão das Jacobinas do século XVII.
Jacobinas eram chamadas na Bahia, as terras de
vegetação baixa e espinhosa que formavam o sertão. Desde o século XVII,
Jacobina, entendida como sertão, estava situada no centro da Capitania da
Bahia. Tornou-se conceito de tudo quanto se contasse fora do recôncavo e do
litoral, um nome opulentado de grandezas e de misérias, por seus metais e
índios bravos. Foram terras ocupadas e povoadas colonialmente a partir do gado
e vaqueiros dos D’Avila da Casa da Torre. Família de sesmeiros que possuía
duzentas e sessenta léguas pela margem esquerda do rio São Francisco e oitenta
léguas pela margem direita do mesmo rio.
As Jacobinas dividiam-se em Jacobina Velha e Jacobina Nova. A
primeira situava-se entre o Rio Salitre e a Serra da Jacobina ocupando a maior
parte do Município de Campo Formoso. A segunda ficava mais ao sul e Oeste e
abrange quase todo município de Jacobina.
2. Os primeiros habitantes
As terras do município de Campo Formoso eram habitadas pelos
índios Sapoiás, Payayás e Secaquerinhens, todos pertencentes ao grupo dos
Quirirus, formando a grande nação dos Tapuias. Eram guerreiros valentes e
fortes, viviam da caça e da pesca e moravam em casa de palha de ouricurizeiro,
uma palmeira abundante nos campos da região das Jacobinas. Vestiam-se de penas
de aves, de peles de animais e durante o verão andavam completamente nus.
Comiam frutos das matas, animais que caçavam e peixes dos rios e riachos.
Plantavam milho e mandioca em pequenos roçados.
Durante o verão moravam nos vales frescos situados entre as serras
das Jacobinas. No inverno migravam para as caatingas do Salitre do São
Francisco fugindo do frio rigoroso dos grotões e serras. Evidencia deste
nomadismo foram contatadas a partir dos estudos de pinturas rupestres feitas em
rochedos e cavernas existentes na região.
No cotidiano, “dormiam em redes e usavam botoques auriculares,
pintando-se com genipapo e urucum”. Suas doenças “eram explicadas por fatores
sobrenaturais”. Cada tribo tinha seus pajés que eram como sacerdotes
encarregados de se comunicarem com os espíritos, zelar para que fossem
guardadas as tradições da tribo a fim de que não se perdessem os ensinamentos e
a sabedoria transmitida pelos antepassados.
3. A criação
de gado
As primeiras cabeças de gado
vieram para o Brasil do arquipélago de Cabo Verde, em 1534,
para a capitania de São
Vicente. Em 1550 Tomé de Sousa mandou uma caravela a Cabo Verde trazer um novo
carregamento, desta vez para Salvador. Da
cidade, o gado começou a espalhar-se rumo a Pernambuco e para o nordeste e o norte,
principalmente Maranhão e Piauí.
A partir de 1620, Francisco Dias
D’Ávila, neto do primeiro Garcia D’Ávila, promoveu o povoamento do Sertão das Jacobinas
a partir da criação de gado, fator preponderante da penetração colonizadora. Entre os anos 1654 e 1659 o Padre Antônio
Pereira e seu irmão Garcia D`Ávila conseguem uma sesmaria, nela estava a área
onde situa-se o município de Campo Formoso.
Com a criação de gado foram instaladas fazendas
e currais administradas por feitores, vaqueiros e boiadeiros. Contudo, a
criação de gado teve como um dos seus obstáculos os índios. Por não quererem
entregar suas terras ao gado muitas guerras foram movidas contra as tribos da
família kariri e nação payayá. Os Garcia D’Ávila promoveram verdadeiros
massacres aos indígenas do Sertão das jacobinas.
4. A busca dos metais preciosos
Além da frente pastoril, outro
movimento que confrontou os colonizadores com os povos indígenas foi à busca
por metais preciosos. Este foi o impulso que provocou os maiores transtornos
aos índios. Havia interesse em descobrir o ouro, a terra do Eldorado, ou
diamantes como na Índia, e prata como nas minas do Potosí, na atual Bolívia. O sonho das riquezas estimulou a
penetração, e foram surgindo arraiais. Na região do rio Salitre, se falava em
minas de prata e pedras preciosas, como à ametista.
A partir da segunda metade do
século XVI, diversas expedições, em sua maioria, saídas de Salvador, da Vila de
Porto Seguro e de Ilhéus, partiram com um ímpeto inicial de buscar supostas
riquezas minerais. Desse período, as principais entradas para a região onde se
encontra o município de Campo Formoso foram as de Gabriel Soares de Souza e
Belchior Dias Moréia.
É provável que Belchior Moréia seja o primeiro bandeirante a
penetrar nessa região. Organizou uma entrada que longamente percorreu o sertão
durante oito anos, lá pelo final do século XVI. Sua demora foi tamanha, a ponto
de supor sua família que ele houvesse perecido nos grotões do interior
cobiçado.
Belchior Moréia revelou ter encontrado fabulosas minas de prata,
entretanto, afirmou que só revelaria a sua localização caso tivesse a garantia
das promessas de privilégios pelo Governo-geral. Como seus requerimentos não
foram atendidos pelas autoridades, morreu sem revelar a sua devida posição. O
que despertou nas sucessivas gerações o interesse pela célebre “lenda sobre as
minas de prata”.
Passaram pelo Sertão das Jacobinas aventureiros seguindo a trilha
de Bento Surrel, que descobriu o salitre em 1671 o salitre, longamente
procurado por enviados da coroa portuguesa, aventureiros como o já citado
Belchior Dias Moréia e o próprio Francisco Dias D’Ávila, segundo Senhor da Casa
da Torre. O governador D. João de Lencastro andou por esta região atravessando
matas inóspitas em busca do salitre e ainda para pesquisar e desvendar minas no
tempo do Vice-Rei Vasco César. Também andou por aqui o lendário Romão Gramacho,
cujo nome está ligado à procura de ouro nos sertões da Bahia.
Os D`Ávila
escravizaram os índios para trabalharem
em minas de extração de salitre, situadas na região de Pacuí e apossaram-se das
riquezas naturais e das melhores terras dos índios. Essa família organizou
diversas campanhas contra os índios, entre elas, destaca-se a do Salitre,
considerada a mais cruel e injusta, na qual foram sacrificados quase quinhentos
guerreiros índios.
A mão de obra utilizada para a
extração e transporte do salitre era de indígenas como os grupos payayá,
sapoiá, secaquerinhens e cacherinhens, aldeados por missionários espaços reduzidos e definidos. Os pagamentos desse serviço nem sempre eram realizados e havia
muitas denúncias de abusos, agravando as tensões entre os índios e os colonos.
Vale
ressaltar que os indígenas viviam misturados com outros grupos étnicos e expostos
a doenças, conflitos e maus tratos. O salitre era
transportado em lombo de burros para o porto da Bahia e lá seguia para
Portugal. Desse minério extraia-se a pólvora utilizada na indústria da guerra.
5. O trabalho missionário
O processo de colonização de Campo Formoso colonização se
desenvolveu graças à ação dos missionários jesuítas. Vieram para o Brasil com
objetivo de catequizar as populações nativas e, por meio de sua ação, acabavam
dando uma justificativa religiosa à presença dos portugueses em terras
distantes. A disseminação do cristianismo acabava dando sustentação a toda
exploração e expropriação praticadas nesse tempo.
Os primeiros missionários a manterem contato com os payayá no
Sertão das Jacobinas foram os da Companhia de Jesus. Organizaram expedições
missionárias com o intuito principal de catequizar tais populações. Uma das
entradas organizadas por estes religiosos ocorreu por volta de 1656 e, sendo
liderada pelo padre Rafael Cardoso, o qual passou pelas serras das Jacobinas e
visitou os sapoiá e os payayá. Conta-se que naquela época havia mais de 80
aldeias espalhadas pelos vales e planícies das Jacobinas.
Por conta disso, houve as expedições de 1666 chefiadas pelo padre
Jacob Roland e pelo teólogo João de Barros, na qual eles fundaram a Missão de
Jacobina (São Francisco Xavier), construindo uma Igreja na aldeia dos sapoiá.
As primeiras missões dos jesuítas ficavam na Jacobina Velha, eram
a Missão de São Gonçalo do Salitre, Missão da Aldeia dos Payayás e Missão de
São Francisco Xavier. A Missão de São Gonçalo do Salitre foi fundada em 1666,
situava num lugar denominado Laranjeiras e suas ruínas existem próximas ao
povoado de Abreus, no Vale do Rio Salitre. Supõe-se que a Missão da Aldeia dos
Payayás ficava próxima ao local onde hoje se encontra a cidade de Campo Formoso.
A situação das missões passou a ser não
tranqüila em função da perseguição empreendida pela família Garcia D`Ávila. No ano 1675, após um levante de indígenas na região do
Rio Salitre foram assassinados muitos feitores e vaqueiros e dizimados grande
parte do rebanho, o governador Afonso Furtado de Mendonça encarrega Francisco
Dias D’Ávila II de organizar uma expedição punitiva contra os 800 índios
rebelados. A Campanha do Salitre foi um dos episódios mais sangrentos da nossa
história.
Até 1682, o Sertão de Jacobina se
tornou muito povoado para os parâmetros da época, diante disso as autoridades
religiosas perceberam que a região se consistia em uma área estratégica para
desdobrar-se em Freguesias. Então, em 1682, o povoado que surgiu no mesmo
espaço em que foi fundada a missão de São Francisco Xavier, que situava-se nos
arredores de onde é hoje a cidade de Campo Formoso foi elevada à categoria de
freguesia, pelo decreto do 1º arcebispo da Bahia, D. Gaspar Barata de Mendonça,
recebendo então o nome de Freguesia Velha de Santo Antonio da Jacobina.
A Freguesia Compreendida num
circuito de trezentas léguas, representou um dos primeiros núcleos coloniais do
sertão norte da Bahia e consolidou o povoamento do sertão de Jacobina. O
principal fomentador do progresso da região da Freguesia Velha de Santo Antonio
foi à exploração do minério do Salitre no Pacuí (oficina Nossa da Encarnação) e
nas minas de João Martins e João Peixoto.
A região em que foi fundada a missão jesuíta de São Francisco
Xavier e, respectivamente, criada a sede da Freguesia Velha de Jacobina,
supostamente pertencia aos D’Ávila. E, diante deste movimento de organização do
espaço para as atividades religiosas, a Missão de São Francisco Xavier sofre
intensa perseguição por parte do elemento colonizador. O aldeamento é alvo das
constantes hostilidades dos sesmeiros e colonos devido aos direitos de posse
das terras e da submissão dos índios, a aldeia de São Francisco Xavier nas
Jacobinas sofreu sucessivos assaltos da parte dos curraleiros, tais fatos
culminam com a destruição da Missão de São Francisco Xavier.
Depois desses
abusos, por volta de 1697, os jesuítas abandonaram definitivamente os
aldeamentos das Jacobinas e o trabalho missionário foi ocupado pelos franciscanos.
Estes missionários ficaram incumbidos de atuarem nas fábricas de salitre,
possivelmente nas atividades de capelão e no fornecimento de mão de obra
indígena para o serviço de extração e transporte do salitre.
No ano 1757, o
Padre Manoel Monteiro comprou a D. Ignácia de Araújo Pereira, viúva do Coronel
Garcia D’Ávila Pereira, cinco sítios situados na Jacobina Velha que mandou
leiloar entre os pobres descendentes de índios fazendo, assim, a primeira
reforma agrária da região.
Em 1770 a Freguesia Velha
de Santo Antonio da Jacobina era a mais importante povoação da região das
Jacobinas. Esse desenvolvimento alimentou o desejo da população daquela época
para a elevação da freguesia para a categoria de vila. Apesar dos argumentos
razoáveis, nenhuma decisão foi tomada a respeito. E o povoado de Santo Antonio
esperou 110 anos para que acontecesse este desejo tão almejado por sua
população.
E, aos 28 de julho de 1880
por força da Lei Provincial nº. 2051, assinada pelo Governador da Província da
Bahia, D. Antonio de Araújo Bulcão, foi criada a vila de Campo Formoso (antiga
Freguesia Velha de Santo Antonio do Sertão da Jacobina), com todos os limites
da Freguesia. Criada com território
desmembrado de Vila Nova da Rainha, atual Senhor do Bonfim. A instalação do município
deu-se em 22 de julho de 1883.
No século XX a sede do
município foi eleva da à categoria de cidade, precisamente no dia 30 de
novembro de 1938 pelo Decreto-Lei Estadual, nº. 11.089, que entrou em vigor no
dia primeiro de janeiro de 1939. Localizado
na encosta da Serra da Jacobina, Campo Formoso, é uma cidade cheia de ladeiras
e colinas. Sobre o Morro dos Alecrins, situam-se
o centro comercial, as repartições públicas, os hotéis, hospital, igrejas e
antigas residências.
REFERÊNCIAS
SILVA,
Almacks Luiz. Rio Salitre (Bacia do São Francisco), artigo de Publicado em fevereiro 17, 2010 por HC http://www.ecodebate.com.br/2010/02/17/rio-salitre-bacia-do-sao-francisco-artigo-de-almacks-luiz-silva/
CUNHA, Tatiane Oliveira da. ANPUH – XXV SIMPÓSIO NACIONAL DE
HISTÓRIA – Fortaleza, 2009. “Porta-vozes da Romanização”: Capuchinhos em missões populares em Sergipe
(1901-1923).
SOLON, Natalício Araújo dos Santos. ANPUH – XXV SIMPÓSIO NACIONAL
DE HISTÓRIA – Fortaleza, 2009. Políticas
Indígenas nos aldeamentos da Vila de Santo Antonio de Jacobina (1803-1816).
FREITAS, Edith Alves de A.; SILVA, José Freitas da. História da Freguesia Velha de Santo
Antônio Campo Formoso. 2. ed. Salvador: Secretaria da Cultura e
Turismo, 2004.
SOLON, Natalicio Araújo dos Santos. Diáspora
indígena no Sertão das Jacobinas (1673-1706). Disponível em:
http://www.ppgh.ufba.br/IMG/pdf/DIASPORA_INDIGENA_NO_SERTAO_DAS_JACOBINAS_1673-1706_Solon_Natalicio_dos_Santos_.pdf.
Acesso em 21 de fevereiro de 2013)
WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Colonização do Brasil. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Coloniza%C3%A7%C3%A3o_do_Brasil. Acesso
em: 26 de março de 2013.
COLAÇO, Miguel Ângelo da
Silva. Etnobotânica
dos índios Pankararé, no Raso da Catarina - Uefs. 2006.Disponível em: http://www2.uefs.br/ppgbot/pdf_dissertacoes_teses/mestrado/2006/miguelcola%C3%A7o.pdf#page=1&zoom=auto,0,849.
ALDEAMENTOS JESUÍTAS E POLÍTICA
COLONIAL NA BAHIA. SÉCULO XVIII. Fabricio Lyrio Santos / Revista de História 156 (1º semestre de
2007), 107-128. revistas.usp.br/revhistoria/article/download/19051/21114.
Parabéns pela a iniciativa. Gostei bastante. a história é por aí mesmo.
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